21/12/2010 14:50

O Centro pulsa forte, ainda mais no natal

O Centro é o coração da nossa cidade. Não só no sentido geográfico óbvio, mas no que esse pedaço de chão representa na vida de cada campinense.
É lá que tudo acontece e onde respiramos o cheiro verdadeiro da metrópole, da mescla social de seus trabalhadores honrosos e de sua história carregada de personagens inesquecíveis. Por isso aqui ele é tratado com “c” maiúsculo.

Dia desses, enchi os olhos quando, do alto de um prédio na rua Conceição, avistei imponente um velho companheiro de tantas jornadas radiofônicas: o edifício José Guernelli, no Largo do Rosário, que por tantos anos alojou a Rádio Educadora de Campinas, antiga PRC-9, atual Band.

Para quem o vê do alto, ele ainda ostenta uma das primeiras logomarcas da Educadora, como que para eternizar um condômino tão ilustre e que o tornou também muito conhecido.

Por isso minha referência do “Centrão” é o Largo do Rosário, onde em meados dos anos 80, eu já transitava apressado, como todo office-boy da época, e já iniciava meu namoro com a emissora que irradiava com muito eco sua voz e selava um relacionamento eterno com o lugar. Ainda ouço essa voz por ali, impregnada em sua aura e as vezes até bem real, pelas cordas e comentários do amigo João Carlos de Freitas, que assim como eu, não abandona o lugar e continua observando com carinho seus detalhes e valores. 

Impossível passar pela Barão e não dar uma piscada para o Regina, com seu café que inebriava o Brasa e os muitos jornalistas, torcedores e dirigentes, que em suas paredes deixavam a marca de seus sapatos cansados, discutindo o futuro de nosso futebol, depois de uma boa canja no Éden. Regina, ali em frente a Orly, dos maravilhosos confeitos e da Tortinha de Frango do meu “irmão” Lúcio Benatti, do lado do Jockey, que se mantém firme, brigando contra o tempo que insiste em tentar em vão nos desfazer de tantas lembranças. Jockey que até hoje reúne em sua calçada, bem abaixo da batuta do maestro, outros tantos saudosistas e memórias vivas, como o velho Pedro Possante, de aprendiz de de garçom do Ideal a imortalizador do Psicodélico com o corte boca-de-anjo, que nasceu por ali.

O Centro pulsa forte, resiste aos shoppings e guarda consigo a memória de muita gente que atou ali os mais sinceros laços de amor pela cidade, desde o início, da Barão até a Luzitana, que ganhou os últimos olhares cansados de minha mãe querida.

Mesmo com seu aspecto demais urbano, meio sujo, embaçado pela fumaça dos coletivos e esquecido pelo progresso, o Centro segue romântico, como os beijos nas matinês do Ouro Verde e, mais tarde, nos saraus boêmios do Faca.

Esse velho relicário, onde eternizado está, em uma de suas pedras públicas pichadas, o amor cidadão do poeta Guilherme – “Campinas, amorosa, amada minha. Deixei de ser “eu”, para ser “nós”.
 
Me diga leitor, em qual outro lugar da cidade temos ao menos um quinhão disso tudo?

Mas é no natal que o Centro parece vestir roupa nova. E nesse tempo, eu não resisto a uma caminhada por ali na esperança de encontrar velhos e bons amigos e renovar a certeza da minha cidadania adquirida, mas legítima e confessa. E é lá que o Natal tem mais sentido, onde todos se encontram, sem distinção de institutos, e onde insisto ouvir o eco longínquo da Rádio.

Tantas vezes desprezado por quem tanto comeu no seu prato, relegado ao ultrapassado, como se suas histórias só sobrevivessem nas crônicas do Zeza ou nos registros das lentes do V8, o Centro segue pulsando na vida de muita gente e eternamente aqui dentro do meu peito. Por tudo isso, me preparo agora para tomar o último chope do ano no Giovanetti, mas o do Rosário, é claro, que em nenhum outro lugar tem tanto colarinho de histórias.

Você está convidado.

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